Bruna Jones: Início de carreira sempre é um período complicado, ainda mais como cantora. Mas antes de entrarmos nisso, vamos falar um pouco da sua formação? Você é formada em Letras e, ao entrar no programa, estava cursando doutorado em Língua e Cultura. O que lhe levou a essa escolha acadêmica? Hoje você está exercendo alguma profissão na área?
Alissan: Eu sou formada em Letras sim, e na verdade passei por três graduações, passando pela terceira agora. Prestei o vestibular para Letras, na Universidade do Estado da Bahia e o vestibular para Ciências Sociais na Universidade Federal da Bahia. Passei nos dois vestibulares quando eu os prestei em 2009. Terminei o curso de Letras, mas não finalizei o de Ciências Sociais, larguei faltando um ano e fui para Música Popular, na Universidade Federal da Bahia. No meio disso aí também tentei meu mestrado e o fiz na Universidade do Estado da Bahia e ano retrasado, final de 2019, fiz a seleção para o doutorado em Língua e Cultura lá na federal e passei, então 2020 foi meu primeiro ano de curso no doutorado, entre aspas, claro, porque como teve a pandemia eu praticamente não consegui ter aulas presenciais. Tive poucas aulas e logo tudo parou, então tive aulas de maneira remota como todo mundo. Essa coisa de ter aula a distância deu uma boa adiantada no curso, pelo menos não fiquei parada. O que me levou a fazer essa escolha foi justamente o desejo de tentar unir as duas coisas: eu canto desde os meus 14 anos de idade, então a música já estava na minha vida quando fui para a Academia, e eu tinha essa vontade de tentar juntar essa coisa da língua com a música, e aí eu vi nesse curso de doutorado essa oportunidade. O meu objeto de pesquisa é estudar a construção da identidade afro-baiana a partir dos discursos presentes nas letras das canções cantadas pelo Bloco Afro Ilê Aiyê e aí utilizo a teoria da análise de discurso francesa e outras teorias para analisá-las. Provavelmente também vou utilizar a linguística cognitiva e tudo o mais, enfim, acabarei tendo contato com outras teorias para fazer essa análise. No momento estou sim exercendo uma profissão na área e isso veio a partir do programa, engraçado. Através do Brown eu acabei indo desenvolver um projeto em uma instituição aqui em Salvador, um projeto voltado para a população negra na área da educação e do empreendedorismo e, ainda, desenvolvi outro projeto, que só falta só colocar em prática, o que acontecerá em fevereiro, para mulheres negras, também nessa área do empreendedorismo e também sobre beleza e estética. Tá sendo bem legal, porque gostei da proposta. Para mim é sempre interessante poder contribuir para o crescimento do outro e trocar, já que vejo a troca como esse processo de crescimento. As duas coisas caminham juntas. Quando você troca, você mesmo aprende, além de favorecer o crescimento do outro.
Bruna Jones: Você é graduanda em Música Popular, o que já mostra uma inclinação para o meio artístico. Sempre houve vontade de entrar para essa área? Quais foram as maiores dificuldades que você encontrou no começo desta caminhada musical?
Alissan: Como falei anteriormente, sou graduanda em Música Popular pela federal, estou caminhando para o final do curso, acho que falta um ano e meio para terminá-lo, ainda mais com essa parada que tivemos em 2020, com a pandemia, e sim, canto desde os 14 anos de idade. Fui uma criança bem inclinada para as artes, não vou nem dizer só para a música, mas sim artes no geral. Gostava muito de dançar, dançava pra caramba, em casa, criei grupos de dança com minha irmã, tudo caseiro, mas fazíamos muita coisa. Artes cênicas também, tanto é que fiz teatro, o Curso Livre de Teatro da UFBA em 2015, um curso profissionalizante daqui de Salvador, inclusive temos nomes de atores globais hoje que passaram por esse curso. Essa coisa é um desejo antigo, pois como disse, tinha inclinação, aí surgiu a oportunidade de participar de um festival de música aos 14 anos na minha cidade natal, Feira de Santana, aqui na Bahia também, e pronto. Participei desse festival e não parei de cantar. As dificuldades são inúmeras, porque você se depara com muitas barreiras, e dependendo de quem você seja e de onde você vem, isso pode ser bem acentuado. Eu nasci em uma família muito humilde, pobre, então as perspectivas são baixas, quase nenhuma. Se olhar a sua volta, você não vê muitas saídas, acho que é essa a palavra, então eu costumo dizer que só estou aqui agora, fazendo doutorado em uma universidade pública, entrei no programa, porque acreditei muito. Eu não via nada a minha volta que trouxesse para mim um incentivo, uma luz, para que eu pudesse realmente ocupar esses espaços. A Academia é uma coisa muito distante. Eu fui a primeira pessoa da minha família a entrar numa universidade e se formar, então era muito distante para mim, eu não tinha referências nesse sentido. Viver de música é um sonho para uma pessoa que vem da periferia, negra, mulher, no Brasil isso é bem utópico. Minha mãe sempre dizia “não deixe de estudar, você tem que estudar. Não dá pra ficar pensando só em viver de música”, porque é um caminho muito incerto. Na verdade tudo acaba sendo incerto, nada na vida é certo, mas o estudo pelo menos me daria algum tipo de garantia, então minha mãe sempre incentivou e graças a Deus eu sempre gostei de estudar e entendo a importância da educação de uma forma bem nítida. Costumo dizer que sou cria, fruto, da educação e da arte. São duas coisas bem bases na minha vida. E aí entram outras coisas: a falta de oportunidades, as panelinhas que já existem, os grupos que são impenetráveis e você não consegue entrar. A galera que já faz suas “gigs”, como chamamos no meio musical, e para entrar e furar essa bolha, é a maior dificuldade. É um mundo extremamente competitivo, então você tem que trabalhar toda uma questão emocional para lidar com isso, enfrentar o sexismo no meio disso tudo, por parte de músicos, no meu caso também o racismo... É complicado, porque o racismo também tá aí, nesse lugar, já que temos um racismo estrutural no Brasil. Está em todas as esferas, e você sente isso na pele. São várias e várias barreiras, mas eu vejo a música como uma missão na minha vida, uma coisa muito bonita, que sempre me levou a lugares incríveis, a conhecer pessoas muito legais, já que também é sempre bom olhar o lado bom das coisas. Quando digo que a música sempre me levou a lugares incríveis, não estou nem falando de ambientes grandes, materiais, mas de me deslocar a um lugar que só conseguimos ir através da arte, que me tire dessa realidade maluca em que a gente vive e me leve para outro lugar, outro espaço. Ser conforto, ser afago, alegrar meu coração em muitos momentos, ser um refúgio... A música é um presente na minha vida. Não tenho nem como falar o que ela representar para mim, porque ela é imponente e toma todo o espaço.
Bruna Jones: Você teve o apoio de sua família para ingressar profissionalmente no mundo das artes?
Alissan: Sim, sempre tive apoio dos meus pais, dos meus irmãos. Eles nunca me desmotivaram em relação a isso, mas por outro lado, sempre tive, principalmente por parte da minha mãe, aquele incentivo para estudar, não deixar de cantar, mas também não deixar de estudar, fazer isso em paralelo. Mas sempre me deram sim apoio, inclusive foi minha irmã que fez meu vídeo de inscrição para o “The Voice”. Eu estava bem desanimada, pois já tinha tentado outras vezes, e não queria mais tentar, e ela falou “vamos sim fazer”, com o celular, e fizemos um vídeo caseiro e enviamos. Ela que colocou pilha.
Bruna Jones: Musicalmente falando, quais são as suas maiores inspirações e como elas interferem no seu trabalho autoral?
Alissan: Tenho tantas referenciais musicais! Posso citar Nina Simone, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Ney Matogrosso, Elis Regina, Gal Costa, Caetano Veloso, Maria Bethânia, Elza Soares... Nossa, gosto de tanta gente incrível! Djavan, é muita coisa boa, principalmente Música Popular Brasileira, que sempre escutei muito. E também tem os da minha geração, o Francisco, el Hombre, que inclusive cantei uma música em composição com a vocalista da banda junto com alguns músicos, Luedji Luna, Xênia França, Larissa Luz, Liniker, Majur, é muita coisa. Eu vou deixar de citar muitos, Bob Marley, vários, é muita gente que gosto. E obviamente interferem sim num trabalho autoral porque você tem referências, e elas sempre vão aparecer de alguma forma no que você faz.
Bruna Jones: Recentemente, você esteve brilhando nos palcos da nona temporada do "The Voice Brasil". Quais foram as suas principais motivações para encarar esse desafio?
Alissan: A minha principal motivação para participar do “The Voice”, sendo que eu fui pra lá com muito pé no chão e sabendo bem o que queria, foi poder mostrar minha música e minha voz para uma quantidade maior de pessoas, compartilhar o que eu gosto de fazer, enfim, e a partir disso começar a criar meu público e desenvolver meu trabalho, já que eu tenho realmente enfrentado muitas dificuldades, não sou uma cantora de carreira, não faço shows, então foi uma super experiência participar, até mesmo por isso também, já que ali eu acabei vivendo tudo de vez. Para alguém que não anda fazendo shows, não é cantora de carreira, ali eu acabei vivendo várias coisas, como televisão, que é outra coisa bem diferente. Enfim, o que me motivou foi isso: poder me comunicar, levar minha música, minha voz, o que eu gosto de fazer, minha arte, para uma quantidade maior de pessoas e a partir disso começar a construir meu público e desenvolver meu trabalho. Como eu costumo dizer, criando as minhas oportunidades.
Bruna Jones: Você competiu no programa pela equipe Brown. Acredita que escolhê-lo como técnico foi a melhor escolha a ser feita? O que você aprendeu com ele nesse caminho?
Alissan: Sim, acredito que eu tenha feito uma boa escolha sim em relação ao técnico, pois já era uma escolha que eu tinha dentro de mim há tempos. Sempre pensei que se fosse um dia ao programa e ele estivesse lá, o escolheria. Um cara que também faz parte da minha formação musical, é uma referência para mim também. Eu cresci ouvindo a Timbalada, a percussão, a coisa melódica que ela traz... Tem uma ligação afetiva para mim. Enfim, ele tem uma sensibilidade muito grande. Acho que o que aprendi com ele foi muito isso, a sensibilidade e a humildade que ele tem unidas ao seu talento e sua grandiosidade artística, já que ele é um cara multi-instrumentista, compositor, produtor, que dispensa comentários. Ver essa pessoa que tem toda uma bagagem e uma enorme caminhada apresentando uma sensibilidade e um cuidado no falar, nas colocações, disposto a compartilhar algo com a gente, é muito legal.
Bruna Jones: Devido à pandemia, a temporada buscou seguir os protocolos indicados pela Organização Mundial da Saúde. Uma das novidades foi o confinamento dos participantes em um hotel. Existe alguma história de bastidor que seja divertida/curiosa e você queira compartilhar?
Alissan: Esse negócio de ficar confinado é bem louco, né? De certa forma o que motivou o confinamento, enfim, pandemia, um ano terrível que foi 2020 com toda essa situação, tudo que está acontecendo, mas assim, eu sou uma pessoa que gosta às vezes de estar ali, mais sozinha, então isso de alguma forma eu até usei ao meu favor, porque gosto de repor minhas energias, me concentrar. Gosto de fazer isso, principalmente quando vou cantar. Você estar confinado acaba favorecendo para se concentrar mais, dependendo de cada um, claro. Cada um tem seu jeito de ser, já que aquilo pode ser perturbador para uns e para outros nem tanto. História de bastidor... Eu fiquei tanto no quarto que acho que só lembro de uma coisa, quando desci, saí do quarto para fazer alguma coisa, e depois que voltei eu fiquei quase uma hora fora do quarto, no corredor. Depois fui à recepção do hotel, pedi pra alguém abrir pra mim, demorou pra caramba, e foi aquela agonia. O funcionário do hotel foi lá, tentou abrir de várias maneiras e não conseguia e eu fiquei um tempão do lado de fora esperando. Ele teve que descer pra resolver, chamar outra pessoa e tal, até eu conseguir entrar. Isso foi meio que um castigo, ficar do lado de fora, haha!
Bruna Jones: Como você está lidando com toda a visibilidade que o programa trouxe para a sua carreira? Como está sendo a sua relação com os fãs que chegaram depois dessa participação?
Alissan: Estou tentando lidar da melhor forma possível com a visibilidade. Tenho um carinho muito grande pelas pessoas que chegaram depois da minha participação no programa, as que já estavam antes também... Sinto um carinho muito grande pelas pessoas que acompanham meu trabalho e que gostam de mim, demonstram carinho por mim, porque o artista não existe sem os fãs, sem as pessoas que gostam dele e admiram seu trabalho, consomem a sua arte e o que produz. Estamos vivendo momentos terríveis e isso é uma coisa tão preciosa e tão rara que quando encontramos, precisamos retribuir e acolher aquilo da melhor forma possível. Acho isso muito legal e adoro conversar com o pessoal que vem falar comigo, respondo todas as mensagens, mesmo que demore um tempão, acho importante essa troca e retribuir esse carinho.
Bruna Jones: Nos últimos anos a reciclagem de participantes de reality show virou algo comum na televisão. Você aceitaria um convite para participar de "A Fazenda", "BBB" ou, quem sabe, retornar ao próprio "The Voice Brasil"?
Alissan: Esse negócio de reality show... Eu não sei se aceitaria o convite para participar de um reality tipo "A Fazenda" ou "BBB", tudo pode acontecer, mas não sei. Hoje eu poderia dizer que não e amanhã que sim, pode mudar muito. "The Voice" eu acho que seria interessante voltar, sei lá, se eles criarem uma edição com pessoas que já passaram por lá, acho que poderia ser uma coisa bem interessante.
Bruna Jones: 2020 foi um ano atípico e, de certo modo, frustrante. Para esse novo ano que está se iniciando, você já tem algum projeto em mente? Há algo que queira/possa compartilhar conosco?
Alissan: Sim, estou prestes a lançar o meu single intitulado “Sou Eu” e vou estar realmente falando sobre mim nessa música. Eu a fiz no mês de maio de 2020 e de certa maneira a minha participação no programa foi uma continuação do que já estava acontecendo, do que já estava reverberando em mim, e eu penso que a mensagem dessa música vai trazer e mostrar bem isso, ficará bem nítido. Estou muito feliz porque terminei o ano de 2020 trabalhando no desenvolvimento dessa música, na sua produção, gravei voz no dia 30 de dezembro e iniciei o ano também trabalhando nela. Basicamente posso dizer que ela já está pronta, mixada, masterizada, estou terminando o material de divulgação também e agora é a parte da distribuidora digital, enviar pra eles e dar o tempo deles darem um feedback e eu poder ter uma data de lançamento. Logo, logo, entre janeiro e fevereiro, dependendo da distribuidora, vou estar lançando meu single e depois outras coisas relacionadas a ele.
Bacana a nossa conversa, não é mesmo? E ela ainda deixou um recadinho antes de ir, olha só: "O recado que quero deixar para todo mundo que gosta de mim e acompanha meu trabalho, para os leitores do blog, é um muito obrigada. Agradeço demais por todo o carinho, toda a força, torcida de sempre... Vocês sempre são tão carinhosos comigo, é um afago receber cada palavra, cada mensagem que eu leio, realmente faz muita diferença para mim. Isso eu falo com uma sinceridade real, é muito gratificante, alegra demais o meu coração e isso para mim já é um prêmio. Receber um carinho desses é algo que não tem preço, sabe? Então, só tenho a agradecer e dizer que eu pretendo e irei retribuir tudo isso em forma de música, com muito carinho, muito amor, estou fazendo tudo com muita vontade e na expectativa que todo mundo goste." e para quem quiser continuar acompanhando, basta seguir no Instagram: @alissanoficial, no Facebook: alissan e no YouTube: ALISSAN Oficial. Em breve a música dela estará em todas as plataformas digitais e ela divulgará direitinho, beleza?
Espero que vocês tenham gostado da entrevista de hoje, em breve retornarei com novidades. Continuem acompanhando o blog para não perder nenhuma entrevista nova e nem os nossos projetos com o "BBRAU". Lembrando que quem quiser continuar acompanhando mais nas redes sociais, basta procurar no Facebook, Instagram e no Twitter por @odiariodebrunaj, combinado?
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